Semana passada quase vi um atropelamento em plena Avenida Paulista. Mais uma pessoa poderia ter a vida interrompida em uma das principais avenidas do Brasil.
O que me deixou perplexo é que a potencial vítima nem percebeu...nem viu o que aconteceu porque estava somente de corpo presente.
Explicando: estava entretida, ou melhor, vidrada em seu smartphone, teclando e lendo suas mensagens enquanto caminhava.
Era um jovem. Jovem da geração que eu tenho notado estar cada vez mais conectada e desligada do que acontece imediatamente ao redor de si. Pode estar se comunicando com alguém, virtualmente, que esteja a milhares de quilómetros, sem notar o que acontece a centímetros de seu corpo...
Parece que estamos perdendo o sentido de noção do campo de aproximação (aquele que nos incomoda quando um estranho chega falando de muito perto...).
O fato de nos tornarmos cada vez mais desligados (e extremamente conectados virtualmente ao mesmo tempo...) tem se manifestado de maneira mais frequente que percebemos. Outro dia, na fila da despacho de bagagens do aeroporto, a atendente gritava “próximo!!” e a criatura na minha frente nem se ligava no que estava acontecendo...
Sutilmente, dei um toque em seu ombro e apontei o guichê de atendimento. O “conectado” dirigiu-se a passos de tartaruga simplesmente porque não conseguia tirar os olhos do smartphone.... Pior: ainda chegou ao balcão e falou para a simpática funcionária: “o que é mesmo que você quer?”.
Recentemente aconteceu a morte de uma adolescente pela intensa conexão virtual e ausência de visão espacial. A norte-americana Taylor Sauer (18 anos) sofreu um acidente fatal no dia 12/01/2012 ao dirigir e, simultaneamente, fazer postagens no Facebook através do celular.
Os peritos diagnosticaram que a jovem estava a uma velocidade aproximada de 125 km/h e enviava mensagens no Facebook a cada 90 segundos. "Eu não posso discutir isso agora. Dirigir e postar no Facebook não é seguro! Haha.", dizia sua última mensagem a um amigo. Taylor bateu em um caminhão e, de acordo com a perícia, a garota não teve tempo de acionar os freios.
Hoje a informação é abundante e, ao mesmo tempo, rapidamente descartável, ou seja, muita (mas muita mesmo!) coisa passa pelos nossos olhos e pouca coisa é fixada de verdade em nossas mentes...
Se confrontarmos em termos qualitativos o que estamos consumindo na realidade atual, com a consistência que os bons livros carregam, vamos notar que o que estamos perdendo de fato é conteúdo cultural...(vide também a trilha sonora atual...)
Segundo dados do MBAonline.com, em um só dia de uso de internet temos:
- 864 mil horas de vídeo publicados no YouTube. Isso equivale a 98 anos de vida!
- 250 milhões de fotos postadas no Facebook. Se impressas e colocadas umas sobre as outras, teriam a altura equivalente a 80 unidades da Torre Eifel!
- Dois bilhões de posts em blogs são escritos, o suficiente para preencher edições da revista Time por setecentos e setenta anos...
Tudo isso em um só dia...
Estamos presenciando a formação de uma geração obesa e com as costas arcadas, dependente de tecnologia, conectada com o universo e, muitas vezes, desconectada de valores e coisas simples da vida.
Estamos desprezando, ou melhor, deixando de valorizar coisas como o toque de mãos de amigos e pessoas que se gostam, a ternura de um afago, o prazer de uma caminhada ao entardecer, de uma ida à sorveteria...
Estamos deixando de valorizar os programas em família, as refeições calorosas e barulhentas pelas risadas ou pelas animadas conversas! Em muitas vezes o barulho nas refeições acontece somente pelos bips de e-mails recebidos no celular...
Parece que o mundo está cada vez mais conectado e anda cada vez mais desligado...
Dill Casella é autor do livro “Atitude e Altitude” pela Editora Vozes, de dezenas de artigos publicados em mídia impressa e digital e um dos palestrantes mais criativos e contratados atualmente no Brasil!